quinta-feira, 28 de junho de 2012

Umas horas da noite

Na rua escura de um lugar comum, passava um homem. Ele parecia alegre e misterioso. Muitas pessoas se encontraram com ele durante o seu percurso. Caminhava para lugar nenhum. Ao chegar em seu destino, ele faria qualquer coisa, que não fizesse o menor sentido.
O homem era alto, magro, rosto pálido, olhos e nariz enormes. Estranho. Enfrentava seu caminho.  Estava com uma roupa toda preta. Quando olhava as pessoas, parecia se importar com elas. Ele conseguiu finalmente ser líder da história, nessa rua vazia.
Ele jamais imaginou que encontraria uma razão para que houvesse transtornos em seu pensamento, ao longo dos anos.
A rua não tinha luz, não tinha asfalto, mal se via os carros e as pessoas. Mesmo assim ele enxergava tudo, como se fosse normal. As pessoas o olhavam de uma maneira torta.
Ele não disse uma palavra. Não sorriu, não chorou.
Impossível entender se ele ficava feliz ou triste, ao ver alguém com frio ou dor de cabeça por não comer há mais de 24 horas.
É totalmente perigoso e não recomendável, descrever um homem assim. Da mesma forma, como é perigoso tentar tirar alguma lição de todas as cenas que o homem visualizava.
Quando passava por mansões daquela rua, ele olhava que quase quebrava seu pescoço. Não era uma admiração, era apenas para enxergar como elas eram feitas e talvez, uma curiosidade para saber quem eram os donos das casas.
Em certo momento de caminhada, em presença de luz e asfalto, ele parou. Olhou com um olhar que só ele parecia ter.
Ao caminhar, encontrou uma igreja às 18:39h, no dia 28 de julho. A rua parecia não ter fim. Permaneceu parado, como se fosse necessário fazer uma oração. Fez o sinal da cruz, pouco antes de seguir.
Encontrou uma mulher com um casaco de couro marrom às 19:32h. Nessa hora deu para perceber seu olhar de estranheza, ao ver que ela não estava dentro de um carro de luxo. A suposta advogada ou médica, entrou em seu carro. Agora sim, a imagem combinava com o que ele sempre via em outros lugares. Porém não entendeu porque não havia nenhum ladrão para assaltá-la, naquele momento, às 19:36h. Depois, acostumado com essa cena, ele seguiu novamente.
Apático ele andava durante aquela noite. Ás 22:00h, ainda era possível ver crianças nas ruas, com suas mães ao lado, ou grupos de meninos e meninas que brincavam. Para algumas mães e pais, já havia passado da hora de criança estar na rua. E eis que era um dilema tirá-las de suas brincadeiras.
Aquela cidade não era desenvolvida. Não havia computador para prender as pessoas em suas casas. Uma pena que a TV conseguia substituir o papel da nova tecnologia de hoje. É claro que o homem não deixou de enxergar cenas assim.
Ele chamava atenção, por ser alto e estar vestido de preto. Ele estava de luto. Não havia como saber se ele adquiriu essa personalidade pelas coisas boas ou ruins que via, principalmente naquela rua.
Na casa número duzentos e trinta e cinco, parecia que não tinha ninguém. Teve a sensação de que tinha encontrado abrigo. Logo se viu que era apenas energia que faltava lá. Talvez porque a família estava sem dinheiro para sustentar algo que era tão necessário. A casa era simples, sem tinturas.
Ele prosseguiu, a noite parecia não ter fim.
Enfrentava seu caminho, sem ninguém na rua, senão cachorros, gatos e alguns animais estranhos que faziam barulho.
Tampouco se percebia se era sentimento de medo ou repugnância por tudo o que ele presenciou ao longo da noite.
Em outros lugares o movimento não era tão diferente. Mesmo assim, ele entendeu que aquela rua precisava de mais ajuda.
Depois de muita caminhada, encontrou uma nova vida, outra cidade, bairros e uma nova rua. Sem nada a acrescentar, senão outras pessoas com as mesmas perspectivas de sempre.
A manhã se fez cena quando o sol bateu em seu rosto.
Durante a manhã, quando encontrou seu primeiro amigo ao esperá-lo em uma praça, quase como se fosse trabalhar, contou piadas. Satirizou a rua, como se isso fosse mudar tudo o que viu. Ou para acalmar o seu coração que precisava de ajuda. Ou para tentar entender porque a vida era daquela maneira.
Uma conversa depois de tudo, nunca faz mal a ninguém.

Um comentário:

  1. “Viver é uma guerra, onde cada dia, cada noite é uma batalha vencida.
    Um só homem se torna um exército e precisa perceber tudo que passa a sua volta, não pode escapar um detalhe sequer ou tudo se perde.” Para mim você captou esses ricos detalhes e soube prender de forma sutil a atenção de quem passa umas horas na noite. Tensão, desespero, medo, angustia, crime acontecido confundido com crime à acontecer e risos misturados com as horas. Gostei muito do mecanismo racional usado para mostrar o lado psicológico em harmonia com o físico, do social maior que pessoal e a comprovação que o medo da vida é o mesmo da morte. Agora são seis da manhã, também acho que um café preto não faz mal a ninguém... Abraços....

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